Em 2004, Adolfo Lona criou sua 'vinícola boutique' apostando na produção artesanal e familiar, com foco em pequenos volumes e longos tempos de maturação. 

Esse post é uma continuação da publicação  ►A BORBULHANTE HISTÓRIA DE ADOLFO LONA - PARTE I: O PERÍODO DAS MULTINACIONAIS, publicado nesse blog em 20/03/2025.

Última atualização: 05/05/2025. Foto da abertura: Diogo Sallabery (2018)

DECOLAGEM PARA UM VOO SOLO

Adolfo Lona confidenciou que foi a gradativa perda de relevância do vinho dentro da Martini Brasil, a partir da segunda metade da década de 1990, que o "convenceu a sair". Além da concorrência com o produto importado (que afetava todo o mercado), a fusão liderada pela Bacardi (uma gigante global de bebidas destiladas), ocorrida em 1993, levou o novo grupo econômico a reduzir o foco no fermentado: "o vinho era um acessório!" entrevista ao podcast Talk Taças (03/05/2023)

Em 1999, comunicou a intenção de se desligar, mas reconsiderou a ideia após mudanças na diretoria da empresa (em 2000). Quatro anos depois e bastante frustrado, deixou o grupo Barcardi-Martini sem muito planejamento sobre sua próxima fase:

Eu saí [da Bacardi-Martini] em 2004, em março, e em 2004 crio a empresa Vinhos e Espumantes Adolfo Lona com um primeiro inconveniente: eu não tinha vinhedos! Porque eu não me preparei! (...) Isso para que entendam o quanto eu fui ingênuo, o quanto eu continuei comprometido com a companhia e não pensei o meu projeto!
(Adolfo Lona em entrevista ao podcast Talk Taças, 03/05/2023).

O portfólio da nova vinícola foi consequência do próprio ajuste rescisório de Lona:

Quando eu saí, eu tinha feito um acordo com eles. Eu faço com o vinho de vocês, que era até um vinho que eu tinha feito, um brut rosé, que era o que eu queria lançar [pela Bacardi-Martini] e um vinho tinto merlot e cabernet sauvignon.
(Adolfo Lona em entrevista ao podcast Talk Taças, 03/05/2023).

Assim nasceu o ►ESPUMANTE ADOLFO LONA BRUT ROSÉ, que ainda hoje é seu campeão de vendas. Ele é feito a partir de vinho base maduro (que descansa por pelo menos dois anos antes do início da espumatização) composto por pinot noir e chardonnay, aplicando-se o método charmat com ciclo longo (180 dias). Resultado: "um charmat que não tanto um charmat, mais ao estilo do tradicional, com alguma complexidade, com muita cremosidade". (entrevista ao podcast Tanino Cast, 20/03/2023).

Primeiro rótulo do Adolfo Lona Brut RosePrimeiro rótulo do Adolfo Lona Brut Rosé. Foto: Rodrigo Canabrava.

O primeiro lote do espumante foi produzido nas instalações da De Lantier, em Garibaldi. O enólogo não possuia (como até hoje não possui) os caros e sofisticados equipamentos necessários a elaboração do método charmat.

Já o primeiro tinto - "um vinho jovem, fresco, amável, convidativo" - era proveniente dos antigos vinhedos da Companhia Riograndense, na cidade de Pinheiro Machado/RS (transição da Serra do Sudeste para a Campanha Gaúcha), demonstrando que Lona já era um entusiasta do potencial vitivinícola da Campanha: "nesta região, devido ao solo e clima, as uvas tintas atingem a plena maturação fenólica possibilitando desta forma vinhos mas equilibrados e elegantes" (Adolfo Lona, em post de 21/08/2016 no seu blog Vinho Sem Frescuras).

Garrafas do ADOLFO LONA PINHEIRO MACHADO MERLOT CABERNET SAUVIGNON 2024 e do BARON DE LANTIER CABERNET SAUVIGNON 1989. Foto de Adolfo Lona (2016).

Contudo, o ADOLFO LONA PINHEIRO MACHADO MERLOT CABERNET SAUVIGNON conheceu apenas uma única safra: 2004. Com a troca dos proprietários do vinhedo, "sentimos insegurança na continuidade do fornecimento de uvas desta parcela e abandonamos o projeto" (Adolfo Lona, em post de 21/08/2016 no seu blog Vinho Sem Frescuras).

Lona sabia que não poderia depender da Bacardi-Martini por muito tempo (e estava certo!). No ano seguinte (2005), o grupo vendeu as instalações da De Lantier, se afastando ainda mais do negócio de vinhos finos no Brasil.

Para seguir com o projeto ("produzir os meus vinhos"), precisava garantir o fornecimento regular e imediato de uvas (e não poderia ser qualquer uva!). Sua enologia de mínima intervenção exigia vinhedos formados, em plena produção, capazes de oferecer frutas de excelente qualidade. Assim, foi buscar a solução nas 'sementes que plantou' ao longo de 31 anos de indústria:

Dos 140 e poucos produtores que a Martini tinha, eu selecionei 18 que eu conhecia, com os quais já tínhamos relacionamento. São eles que me fornecem pinot, chardonnay e o merlot com os quais eu faço vinhos até hoje.

Tem gente que questiona: mas você não produz? Se tem gente boa que produz como eu quero e com quem eu posso fazer um acordo, eu me dedico a outras coisas, eu me dedico a fazer o vinho. Isso tem sido a minha saída.
(Adolfo Lona em entrevista ao podcast Talk Taças, 03/05/2023).

Lona precisava dispor também de uma cantina. Com recursos financeiros limitados e pouquíssimo tempo para implantar, montou uma adega "preparada para elaborar pequenas quantidades, de forma artesanal, sem equipamentos sofisticados", em Garibaldi. Buscando proporcionar condições adequadas para cumprir os longos prazos de maturação aos espumantes que se propunha a fazer, investiu em salas abrigadas da luz externa e mantidas a temperaturas constantes e baixas.

O tempo é o melhor aliado da qualidade superior, por isso o ciclo de produção dos espumantes Adolfo Lona são superiores aos habituais: cento e oitenta dias para o método charmat e pelo menos dezoito meses para o método tradicional.
(adolfolona.com.br)

Adolfo Lona em sua adega em Garibaldi

Vinícola Adolfo Lona em Garibaldi/RS1) Adolfo Lona em sua adega, em Garibaldi/RS. Foto: Guilda de Vinhos Adunicamp. 2) Placa na entrada da vinícola de Adolfo Lona em Garibaldi/RS. Foto de Jeriel da Costa (2011).

Para a continuidade da produção de seu charmat, já que não poderia mais contar com  as autoclaves da De Lantier, firma parceria com a Cooperativa Vinícola Aurora de Bento Gonçalves. Desde então, é lá que ele conduz pessoalmente a fase de tomada de espuma do ►ESPUMANTE ADOLFO LONA BRUT ROSÉ e do ►ESPUMANTE ADOLFO LONA BRUT BRANCO (o segundo espumante do portfólio da vinícola: um charmat longo, branco e maturado de chardonnay e pinot noir), ambos feitos com vinhos bases preparado pelo enólogo e que descansaram por pelo menos dois anos.

Adolfo Lona Brut Branco e Brut Rose
O ►ADOLFO LONA BRUT BRANCO e ►ADOLFO LONA BRUT ROSÉ em seus rótulos atuais. Foto: Divulgação.

Em outras palavras, com poucos recursos, algum improviso e boa dose de intuição, lançou as bases de sua 'vinícola boutique' antes mesmo dele próprio conhecer esse termo.

Essa história ainda não para por aqui...